A demanda crescente por compliance nas instituições financeiras

Em artigo, especialistas falam sobre a importância de se conhecer as legislações internacionais para o combate a crimes como lavagem de dinheiro e corrupção

por Camila C. Chizzotti e Alessandra M Gonsales Rocha*

O debate sobre como combater a lavagem de dinheiro, a corrupção e a evasão fiscal tem sido tratado com prioridade pelas autoridades Governamentais e as medidas de prevenção e repressão a essas práticas estão se intensificando. Nessa direção, os esforços para erradicação desses crimes têm ultrapassado as fronteiras locais e atingido níveis internacionais muito rapidamente, dada a sua importância.

É justamente nesse contexto que se torna de suma importância para as organizações o conhecimento das legislações nacionais e internacionais de combate a essas práticas e os programas de compliance estabelecidos e/ou exigidos por elas para prevenir e detectar essas condutas. As legislações mais importantes que tratam destes temas é a Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/98, com as alterações trazidas pela Lei 12.683/12), a Lei Brasileira Anticorrupção (Lei 12.846/13), o FCPA (Foreign Corrupt Practices Act) e o FATCA (Foreign Account Tax Compliance Act).

O mais importante a se destacar é que, em alguns casos, principalmente para as instituições financeiras, pode ser necessária a observância de todas essas legislações. No entanto, é possível a implementação e/ou adaptação de apenas um só programa de compliance abrangente que atenda a todas, o que será objeto deste artigo.

Apesar de menos comentada, o FATCA foi uma lei promulgada pelo Governo Americano em 2010 como parte dos esforços crescentes para impedir abusos fiscais (evasão fiscal) praticados no exterior pelos cidadãos americanos e por pessoas residentes nos EUA. Para esse fim, a referida legislação estabelece uma tributação de 30% para algumas remessas oriundas dos EUA para as instituições financeiras estrangeiras não aderentes. E, apesar de ser uma lei americana, esta produz efeitos extraterritoriais, aplicando-se em nosso país, para as instituições financeiras aderentes.

O alcance das regras do FATCA ainda está indefinido, já que as instituições brasileiras aguardam a confirmação sobre a assinatura do IAG – Acordo Intergovernamental entre as Receitas Federais Americana e Brasileira, que determinará, principalmente, as regras e procedimentos para identificação de clientes americanos e reportes obrigatórios. É certo, no entanto, que as imposições desta norma já estão alterando sensivelmente os procedimentos de compliance e regras de “know-your-client” atualmente adotadas por instituições financeiras brasileiras. Essa revisão com base nas regras trazidas pelo FATCA deve ser feita em conjunto com o Normativo SARB 11/2013 da FEBRABAN, que introduziu diretrizes que consolidam as melhores práticas, nacionais e internacionais de prevenção e combate à lavagem de dinheiro, cuja observância é recomendável mesmo que a instituição não seja signatária.

Lembramos que, mais recentemente, entrou em vigor, a Nova Lei Anticorrupção (Lei 12.846/13) que também trouxe obrigações adicionais às instituições financeiras, obrigações essas necessárias para prevenir as penalidades previstas na referida legislação, que podem ensejar até a dissolução da instituição. Além disso, apesar de ainda pendente de regulamentação federal, essa legislação determina que será considerada na aplicação das penalidades a existência de um programa de compliance.

Para as instituições, cujo grupo econômico esteja vinculado a alguma empresa americana ou que exercem atividades diretamente nos EUA, é necessária a observância, também, do FCPA – legislação americana que combate a corrupção praticada fora dos Estados Unidos.

Considerando as imposições trazidas pelas referidas legislações, há a possibilidade da adoção de um mesmo programa de compliance sob a responsabilidade de apenas um profissional (compliance officer), lembrando que o FATCA prevê expressamente que as instituições financeiras não americanas devem nomear uma pessoa física que será responsável pelo programa de compliance FATCA. Os elementos comuns que devem estar presentes nos programas de compliance para cumprimento das citadas legislações são: (i) compromisso e envolvimento da alta administração; (ii) análise periódica de riscos; (iii) elaboração e/ou atualização de políticas e procedimentos bem definidos, disponíveis e detalhados; (vi) indicação do profissional responsável pelo programa, com autonomia e autoridade na instituição; (v) controles internos; (vi) existência e divulgação de canais de denúncia; (vii) “due diligence” de contas novas e/ou preexistentes e de terceiros prestadores de serviço, (viii) organização e implementação da estratégias de comunicação para cumprimento das leis; (ix) revisão de contratos com inserção de cláusulas para mitigação de riscos; (x) treinamento; (xi) monitoramento e avaliação contínua do programa; e (xii) medidas disciplinares em caso de violação do programa.

As exigências advindas da Lei de Lavagem de Dinheiro e do FATCA tornaram indispensável a completa identificação dos titulares e beneficiários finais de contas, com a identificação das pessoas naturais participantes da cadeia societária e seu percentual de participação.

Sendo assim, considerando todo o arcabouço legislativo recente que introduziu diversas regras e obrigações visando o combate e erradicação de crimes financeiros, as instituições devem rever e adaptar seus programas de compliance para evitar as onerosas consequências da falta de observância de seus requisitos.

*Camila C. Chizzotti – Advogada do escritório WFaria Advogados, atuante na área de Governança, Risco e Compliance, e curso de especialização em Business English na London School of Business and Finance.

*Alessandra M. Gonsales Rocha – sócia do escritório WFaria Advogados, responsável pela área de Governança, Risco e Compliance. Especialista em Direito Empresarial pela PUC- SP e mestre em Direito Comercial pela PUC-SP, tendo conduzido as pesquisas acadêmicas na Universidade de Harvard – EUA.

Publicado originalmente: Blog Estadão - Fausto Macedo